segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

CINEMA



FELLINI: O EXERCÍCIO DA BELEZA
AOS FANTASMAS DOS NOSSOS SONHOS.


Dezenas de Amigos visitantes pediram uma postagem sobre cinema. Aqui está!... E nada melhor do que Fellini para este ponta-pé inicial. Estamos certos?
Fellini é sinônimo de genialidade em fazer cinema, em esmiuçar nossos inconscientes, em expor nossos sonhos, em exorcizar os fantasmas neles contidos.
A temática onírica desse mestre nascido em Rimini (revisitada em Amacord) o fez destacar-se como um dos maiores cineastas italianos do século, ao lado de Monicelli, Passolini, Antonioni, Visconti. Porém, nenhum deles nos oferece uma criação plasmada em imagens tão inquietantes quanto poéticas, por serem a exposição nua e crua dos nossos sonhos, dos nossos pesadelos.

Para ilustrar o que dissemos, cenas de algumas de suas criações.

E, em seguida, sua filmografia.





Um dos takes fantástico-poéticos em La Nave.
Fellini , em entrevista, disse que quando criança vira um barqueiro transportando um gigante animal sobre um mar de prata.
“Eu penso que constantemente vivemos uma contradição onde palavras mascaram a realidade mais do que a revelam, como um farol envolto em neblina. Palavras infectam a realidade. Imagens são feitas com luz e, ainda que atravessem espaços sujos, elas continuam puras”.(...)”A imagem é o componente especial do filme. O que mais ela poderia ser? Se eu lhe perguntasse qual é o elemento essencial da pintura, o que você responderia? Luz, tonalidade...


Em Amacord, Fellini nos deslumbra com imagens de sua infância em Rimini. Como essa do galanteio de um dandi no solarium de um hotel em sua cidade natal.

Em 8 ½, a cena final da corrida em torno da arena de um pseudo circo. Estão presentes todos os personagens que interagiram com Guido-Mastroanni-Fellini. A análise deste gran-finale nos leva a expurgação do inconsciente do personagem-autor dos fantasmas que o atormentavam e lhe tolhiam a vontade de viver e a sua criatividade. A música de Nino Rota é arrebatadora e comovente.

Uma das cenas mais belas em Amacord. “Sempre que um transatlântico passava ao longo de nossa encosta, íamos em barcos ou nadando, até, acenar, gritar nossas alegrias, mostrar nossas emoções desenfreadas”-- disse Fellini.
Cena de Lo sceicco bianco (no Brasil, Abismo de um Sonho).
Como em muitos dos nossos devaneios. Esta cena, com leves “retoques” será recorrente em A Cidade das Mulheres.


A cena referida na imagem anterior.

Em Satyricon, Fellini nos brinda poeticamente com uma análise crítica da decadência do Império Romano. O filme, baseado no livro homônimo de Petrônio, apresenta-nos a narrativa de dois jovens estudantes, amigos, mas ao mesmo tempo rivais devido à disputa de um rapaz escravo-sexual, que iniciam as suas buscas aos prazeres da luxúria em um país reinado pela superstição, pelo misticismo e pela desordem social. Este é provavelmente o filme mais influente de Fellini, porém é o seu menos acessível á grande parte do publico. A construção dos cenários e da fotografia toda ela inspirada em erotismo, fazem desta, vencedora do Oscar de Melhor Realizador em 1970, uma invulgar jornada a um mundo onírico, do qual o autor viria a ser característico e anexado. Satyricon transporta o espectador para um mundo onde a palavra: sexo é a ordem do dia. É no meio deste turbilhão de paixões ou sensualidade que Fellini apresenta-nos um filme que ele próprio afirma, não ter inicio, nem fim. É uma obra tecnicamente superlativa, intrínseca, audaz e ousada como muitos dos filmes do realizador italiano. É um pesadelo colorido da Roma decadente de antes de Cristo, e depois de Fellini.

Fellini caracterizou seus filmes com figuras femininas marcantes, pois que segundo ele mesmo,”elas sempre pulularam meus sonhos quando criança”. Entre elas, o cineasta nos encantou com Saraghina. Esta mulher-prostituta doce e demoníaca de 8 e ½ (aqui dançando uma rumba com Guido/Mastroianni/Fellini) é revisitada em quase todos os próximos de Fellini, ainda que com novas “roupagens”. Fellini, em entrevista, nos diz que “era muito comum estas pobres prostitutas nas cidades costeiras italianas, morando sempre em antigas casamatas, as quais atendiam aos marujos e divertiam-se com as crianças, pois no fundo nada mais eram do que doces crianças.”



Em Amacord, Fellini expõe-nos a Saraghina que o encantava quando
Criança (apresentada em Oito e ½) de uma maneira menos poética mas
eternamente plena de ternura.


A Saraghina de Cidade das Mulheres.
Imagens de algumas mulheres em filmes de Fellini, onde se mescla meiguice, soberba, sensualidade, desencanto, mas nunca tristeza..
Fellini em entrevista, melhor esclarece: “Todos os meus filmes giram em torno destas idéias. Há um esforço de mostrar um mundo sem amor, personagens egoístas, pessoas explorando pessoas, e, no meio de tudo isso, há sempre – e especialmente nos filmes com Giulietta – uma criaturinha que quer dar amor e que viver para o amor”. “Giulietta tem a leveza de um fantasma, um sonho, uma idéia. Ela possui os movimentos, a perícia e a mímica de um palhaço”.
Em Casanova, as cenas se intercalam entre a doçura e o pesadelo. Talvez seja o único filme onde Fellini se expresse com tal acentuado contraste.
“Eu penso que constantemente vivemos uma contradição onde palavras mascaram a realidade mais do que a revelam, como um farol envolto em neblina. Palavras infectam a realidade. Imagens são feitas com luz e, ainda que atravessem espaços sujos, elas continuam puras”.(...)”A imagem é o componente especial do filme. O que mais ela poderia ser? Se eu lhe perguntasse qual é o elemento essencial da pintura, o que você responderia? Luz, tonalidade...”(...)”Uma imagem que expressa uma idéia, um sentimento, uma atmosfera, uma lembrança, e que sugere algo ao espectador que não diz respeito apenas ao ator, mas também a ele. Parece-me que é uma imagem densa em sentido e que representa a alma do filme. Sem a luz você não tem a imagem, e sem a imagem você não tem cinema. Luz é tudo. Ela expressa ideologia, emoção, cor, profundidade, estilo. Pode ocultar, narrar, descrever. Com iluminação apropriada, o rosto mais feio, a expressão mais idiota, pode irradiar beleza ou inteligência. Em meu trabalho, o diálogo é de pouca importância quando comparado à luz e à imagem." .
Uma das cenas mais marcantes dos filmes de Fellini. A personagem de Anita Ekberg banha-se na Fontana de Trevi. Com La Dolce Vita o cineasta italiano dá início ao devaneio em imagens alucinantes focadas no indivíduo e em suas fantasias.
Saraghina retorna no outdoor com a encantadora Anita Ekberg ( a mesma que se banha na Fontana de Trevi, em La Dolce Vita) propagando maior consumo de leite, para o tormento do pseudo-moralista do Dr. Antônio, em As Tentações do Doutor Antonio.

Este é o último filme do festejado diretor italiano, com sua característica de atmosfera de sonho e fantasia.
Em A Voz da Lua, Fellini nos mostra as divagações do lunático Ivo Salvini, interpretado pelo comediante italiano Roberto Benigni. Recém saído de um manicômio, ele vê o mundo de maneira diferente das outras pessoas, de um jeito poético e particular.
Poeta e visionário, é fascinado pela lua e vive à procura dos sons esquecidos pela saturação do barulho na sociedade moderna; o segundo é um ex-prefeito paranóico, angustiado com a velhice que chegou. Certo dia, eles descobrem que a lua fora aprisionada e o poeta se apavora com a possibilidade de que ela não mais possa voltar ao céu. Enquanto sonha com o amor, conta com a voz da lua para guiá-lo em suas aventuras. Uma experiência sucede a outra e, em todas elas, Fellini trata de evocar os males do mundo modernos e os conflitos da natureza humana, com muita sensibilidade. Baseado em romance de Ermanno Cavazzoni.








Filmografia.

1950
Luci del varietà*
(Mulheres e Luzes)


1952
Lo sceicco bianco
(Abismo de um sonho)


1953
I vitelloni
(Os boas-vidas)


1953


L'amore in città**
(Amores na Cidade)


1954
La strada
(A estrada da vida)

1955
Il bidone
(A trapaça)


1957
Le notti di Cabiria
(Noites de Cabíria)

1960
La dolce vita
(A doce Vida)

1962
Boccaccio '70***
(Boccaccio`70)


1963

(Oito e meio)

1965
Giulietta degli spiriti
(Julieta dos espíritos)

1968
Tre passi nel delirio****
(Histoires extraordinaires) (Histórias Extraordinárias)


1969
Satyricon
(Satyricon de Fellini)

1969
TV
Block-notes di un regista
(Anotações de um Diretor)


1971
I clowns
(Os Palhaços)


1972
Roma
(Roma de Fellini)

1973
Amarcord
(Amacord)

1976
Il Casanova di Federico Fellini
(Casanova de Fellini)


1978
Prova d'orchestra
(Ensaio de Orquestra)

1980
La città delle donne
(Cidade das Mulheres)

1983
E la nave va
(E La Nave Va)

1986
Ginger e Fred
(Ginger e Fred)


1987
Intervista
(Entrevista)


1990
La voce della luna
(A Voz da Lua)

(*) co-creditado a Alberto Lattuada
(**) segmento Agenzia matrimoniale (Agência matrimonial)
(***) segmento Le tentazioni del dottor Antonio (As tentações do doutor Antônio/António)
(****) segmento Toby Dammit